Cientistas em saldos - Público

Cientistas em saldos
25.10.2008 - 17h17 David Marçal*

"Sabia que há cientistas que ganham 745 euros? Que não têm direito a subsídio de desemprego, férias, Natal ou alimentação? Que não são aumentados há seis anos? Está naturalmente curioso de saber em que país, mas estou certo de que já adivinhou. São os bolseiros de investigação científica! Uma designação infeliz para os jovens (e menos jovens) investigadores, pois classifica-os pelo tipo de regime contratual com que exercem funções, secundarizando a natureza da actividade (investigação). Faz tanto sentido como descrever um juiz como um "assalariado da justiça".
Os bolseiros podem-se distinguir segundo o tipo de bolsa que têm. Os BIC (bolsa de investigação científica) são licenciados e, independentemente da sua experiência ou competências, ganham 745 euros. Os BD (bolsa de doutoramento) têm em geral um excelente percurso académico e científico (não é fácil ganhar a bolsa!), são investigadores experientes e motivados, ganham 980 euros. O mesmo valor desde 2002, o que representa face à inflação acumulada uma perda de 18 por cento do poder de compra.
Pode-se argumentar que os bolseiros "estão em formação" e que "já é uma sorte estarem a ser pagos". Mas trata-se de adultos (uma licenciatura não se acaba antes dos 22-23 anos) com contas para pagar e legítimo direito à emancipação (ou um cientista tem que viver em casa dos pais?). E quanto à formação, creio que qualquer bom profissional está sempre em formação. Todas as carreiras têm fases e o doutoramento é apenas uma fase da carreira de um cientista.Os bolseiros têm direito ao chamado "seguro social voluntário" - que é uma espécie de não sei o quê. Basicamente, a entidade que concede a bolsa paga contribuições para a Segurança Social, equivalentes ao salário mínimo. Este é o regime pelo qual estão abrangidas as pessoas que não têm rendimentos. Por que raio enfiaram os jovens investigadores aqui? Fazendo o Governo gala de integrar todas as classes profissionais no regime geral de Segurança Social, que coerência tem não incluir os bolseiros? Esta reivindicação tem sido sucessivamente negada pela tutela. Para que não haja dúvidas: os jovens investigadores querem ser integrados num regime de Segurança Social que outros grupos profissionais não querem porque acham que é mau!Penso que é necessário criar a percepção social deste problema e da necessidade de evolução, começando pelos próprios investigadores e professores do quadro que trabalham com bolseiros que beneficiam do seu trabalho, com quem publicam artigos e escrevem patentes. Creio que seria de todo justo e adequado que os cientistas e investigadores estabelecidos tomassem pública e politicamente o partido dos jovens investigadores. A alternativa é continuar o choradinho da fuga de cérebros. Não há fuga de cérebros. Há expulsão de cérebros. Se não fazem falta, isso é outra história. Mas sendo assim, digam."
*Investigador em bioquímica. Bolseiro durante seis anos
E, como comentou o Pedro, de Lisboa:

30.10.2008 - 20h21 - Pedro, Lisboa

"É verdade que o regime de bolseiro é muito pouco dignificante para quem tem uma formação superior. Lá por o estudante de doutoramento ser remunerado de 980€, se encontrar em formação, é preciso admitir que é pouco. Ora vejamos, um médico, terminada a sua licenciatura, inicia o seu internato, que não é mais que uma formação, cujo objectivo é a especialidade. E o primeiro ordenado do médico, recém-licenciado, é superior a estes 980€, para além que tem todos os direitos que uma pessoa com contrato de trabalho tem. Estou e sou solidário com a vossa causa."
E acrescento eu: é uma vergonha.

Mais uma ausência...

Pois é, estou novamente de partida, mas desta vez por motivos profissionais. Durante os próximos dias, estarei na Holanda no congresso da Sociedade Europeia de Imunodeficiências.
Portem-se bem.

Promets-moi



E pronto, chegamos à vez do Kusturica. Que também passou na Festa do Cinema Francês, algo estranhamente - mas, pelos vistos, o filme também tem produção francesa.
Não me vou alongar muito sobre este filme. Porque não há assim tanto que se possa dizer. O filme é um disparate total, bem ao jeito de Kusturica. Mas, desta vez, o disparate é tal que deixa de ter piada. Não há a inocência que se vê nos outros filmes, e que nos faz sorrir perante o impensável. Aqui, parece que a intenção está corrompida.
Não gostei. Aliás, 5 minutos após o filme começar, já eu estava a pensar que aquilo não ia correr bem. E não correu mesmo.
Alguém ainda me há-de explicar o porquê da fixação por animais.... Deixem os bichos em paz!

Paris



Decorreu, nos passados dias, a Festa do Cinema Francês. Habituei-me a "frequentá-la" quando ainda estava em Coimbra, mas sei que falhei as edições do último ano ou dois.
Este ano, por iniciativa da prima Carol, fui ver dois filmes - este Paris, do qual vos falarei aqui, e Promets-moi, o último filme de Emir Kusturica, do qual falarei no próximo post.
Paris é a mais recente obra de Cédric Klapisch, o mesmo que realizou A residência espanhola, que se tornou um ícone de toda a geração Erasmus. Conta, novamente, com Romain Duris, desta vez bastante mais magro, e Juliette Binoche, entre outros nomes bem conhecidos do cinema francês, mas que eu não sei.
Pierre (Romain Duris) é um bailarino que descobre que tem uma série doença cardíaca e que precisará de um transplante, que tanto o poderá curar como não. Elise (Juliette Binoche) é a sua irmã, solteira e com 3 filhos, que se muda para casa dele assim que sabe do problema do irmão. Pierre passa os seus dias a observar Paris da sua varanda, a inventar histórias para os personagens que se passeiam em frente aos seus olhos. É assim que ele escolhe viver perante a doença. E são essas histórias que nós vamos seguindo, ao longo do filme.
Há já muito tempo que não via cinema europeu (e tinha saudades!). Acusem-me de pseudo-intelectualismo, não me importo! Tinha saudades da profundidade deste tipo de cinema, do interesse pelas personagens, pela facilidade com que a história flui.
Gostei muito, muito. Porque é Paris. Porque Paris é maravilhosa. Porque Paris não é, aqui, a história principal. Mas dá-lhe cor.

A thousand splendid suns - Khaled Hosseini



Acabei recentemente de ler o "último" livro que recebi por ocasião do meu aniversário, A thousand splendid suns, o segundo livro de Khaled Hosseini.
Como já tive oportunidade de aqui escrever, gostei muito do The kite runner e, por isso, tinha algumas expectativas em relação a este segundo livro.
O primeiro está escrito numa perspectiva masculina. Neste, temos a visão feminina da história dos últimos 40 anos no Afeganistão, pelos olhos de Mariam e Laila, cujas vidas se cruzarão na mais improvável das situações...
Não me vou alongar muito em resumos da história, até porque é coisa que não gosto de fazer, como se calhar já deram conta.
O livro é bastante intenso, tal como The kite runner. Acende em nós a solidariedade adormecida, relembra-nos que há coisas bem mais importantes na vida do que o stress do dia-a-dia ou as preocupações do trabalho. E, embora não seja uma forma de pensar que eu goste particularmente de defender, mostra-nos como, no fundo, temos tanto para dar graças. Tantas coisas boas que passam despercebidas...
Leiam, vale a pena. Mesmo que custe em determinados momentos.

Desejos Selvagens



No regresso aos convites para antestreias, coube na sorte ganhar bilhetes para este "Desejos Selvagens", em inglês Savage Garden.
O facto de contar com Julianne Moore no principal papel era um ponto a favor. Mas, com o visionamento do filme, todos os pontos a favor foram por água abaixo. A história, baseada em factos verídicos, pelo aquilo que eu sei, centra-se na família Baekelands, constituída por Brooks, o herdeiro da fortuna, Barbara, a mulher excêntrica com quem ele casou, e o único filho de ambos, Tony.
Qualquer uma das personagens é altamente disfuncional. No entanto, o filme não tenta analisar as causas desses perturbações, mas está antes construído de forma a explorar, o mais possível, o que daí resulta, todo o caos e toda a perversão.
Eu não gostei do filme. Mesmo nada.
E se não me agradou a história, em si, ainda menos me agradou a forma como é contada.